quarta-feira, 4 de abril de 2012

Crítica: Lunar

Filmes de Ficção Científica "Hard" não costumam agradar muito ao público. Sem espaçonaves legais, super ciência ou alienígenas "do mal", são muitas vezes visto como chatos, tediosos, e presunçosos. Lunar, de Duncan Jones (filho de David Bowie), é um desses filmes. Contando com apenas dois personagens por boa parte do filme, e passado na imensidão vazia do solo lunar, não é um filme "fácil", de maneira alguma.



Lunar é um filme sobre identidade, sobre realidade, e sobre memória. Sam Bell (Sam Rockwell) é um minerador de hélio 3, estacionado sozinho em uma base lunar, acompanhado apenas por GERTY, um assistente robótico (com a voz de Kevin Spacey). Proximo ao fim de seu contrato de 3 anos, Sam encontra-se "psicologicamente instavel", e um acidente de trabalho lhe deixa duvidoso da realidade de sua situação. Não é possível contar mais sem estragar o filme.

Esse é o primeiro filme de Jones, uma homenagem aos "grandes filmes" de FC pré "Star Wars", como "Solaris", "Silent Running" e em especial, "2001 : Uma odisséia no Espaço". Da arquitetura da base lunar, com suas passagens hexagonais e monitores preto e azul "retrô", à tomada de Sam abrindo a comporta principal, o traje espacial de Bell, os sons usados nas "caminhadas", e a atuação "distante" de Spacey, Lunar mimetiza 2001. Mas Sam não é Bowman, e GERTY não é HAL 9000.  Embora use elementos visuais semelhantes, Lunar é sua própria criatura. Enquanto o Bowman de Keir Dullea é mais frio e "deshumano" que HAL 9000, o Bell de Rockwell é demasiadamente humano. Sofre com o isolamento, com a falta de quem conversar, com a companhia fria de GERTY. Da mesma maneira, enquanto HAL é incarnado atravez de suas câmeras, montadas em uma forma que remete o monolito, GERTY se expressa atravéz de Smileys. Onde 2001 trata da jornada da humanidade, Lunar trata a de um único homem.

Apesar do título, a Lua é apenas um "backdrop" de Lunar. O grosso do filme é apenas Sam, GERTY, e o isolamento. A atuação tocante de Rockwell é reforçada pelo uso pesado de closes, durante suas conversas com GERTY, enquanto faz seus hobbies, quando vê as mensagens enviadas pela esposa. A caracterização é complementada por fragmentos do "dia á dia" de Sam, como os nomes rabiscados sobre os monitores e os adesivos, fotografias e desenhos espalhados pela base. Há momentos em que a atuação de Rockwell é um "soco na cara" do público, com a saudade de casa. Pequenos detalhes nas cenas, dão pequenas pistas de que haja algo de errado, como os "saltos" no vídeo que recebeu de casa, o alerta sobre o extrator "inativo", algumas das perguntas de GERTY... Todas pistas do que Sam está por descobrir. Embora não demonstre emoção na voz, GERTY atrai empatia, exibindo suas "emoções", reais ou não, pelo monitor, e parece realmente preocupar-se com Sam.

Além do uso generoso de Closes, as cenas de Lunar são em sua maioria planos abertos, e, bem visivelmente, fora de alguns planos gerais, não se faz uso de angulações mais chamativas. Quase todas as cenas são angulos retos, "De frente" para o take, muitas das tomadas abertas são limitadas "fisicamente" pelas paredes da base lunar, e os objetos em cena "fecham" o take. O uso da câmera parece ter sido inspirado também por 2001, que usava os mesmos planos "fisicamente fechados" e closes retos nos personagens. O efeito é "clínico", preciso demais, parece à nossos olhos acostumados com angulos mais livres, e takes menos "emoldurados". Junto com as paredes brancas e perfeitas da base lunar, é um ambiente "claustrofóbico", pesado, frio. É justamente nas cenas em que Sam está em um veículo de exploração que, paradoxalmente, o cenário não parece sufocante.

Porém, Lunar tem suas falhas. Mesmo para o padrão de FC Hard, o filme é vagaroso, e a sensação claustrofóbica dos cenários tornam o filme cansativo. O número minúsculo de personagens, embora seja a chave do filme todo, torna o filme ainda mais "estafante" do que as tomadas sufocantes e em alguns pontos é dificil acompanhar alguns detalhes do filme.  E Jones emula tão bem o estilo dos filmes da década de 70 e 80 que Lunar pode parecer "datado", embora seja um filme de 2009.

Por outro ponto, Lunar é um exemplo de filme onde a pesquisa foi feita direito, a ponto de ser exibido em cursos do centro espacial da NASA em Houston.

Em um ano onde a CGI reinou suprema, Lunar consegue fazer muito através do uso de modelos. Da base Lunar até os gigantescos veículos de extração de Hélio, tudo foi produzido com miniaturas, e as poucas cenas onde há o uso de CGI, esta não distraí do resto do filme. Na melhor tradição da FC Hard, de Clarke e Asimov, Lunar dá á tecnologia um papel secundário, e escolhe lidar com a relação do homem com o mundo novo. Frente as evidências, a pergunta que se levanta dentro do filme é "quem é Sam Bell?" e "este homem realmente é Sam Bell?". Como a boa FC, Lunar trata de idéias, de pessoas, aqui, o mistério da identidade. "Como podemos afirmar que somos quem somos, se não temos provas disso?", Jones nos pergunta. E nos provoca ao questionar que importância teriam as provas.


3 comentários:

  1. Eu adoro FC e todos os grandes clássicos que falas já os li ou vi na grande tela. Este filme parece sufocante de bom!
    Obrigado por dares a conhecer mais um bom filme, desta vez no meu género favorito:FC!
    O trailer está mito fixe!
    :)

    Abraço

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  2. Quando ouvi falar deste filme pela primeira vez fiquei, já fiquei interessado. Agora, ao ler esta sua crónica, a vontade de o ver ainda se intensificou mais, mesmo com as falhas que você aponta.

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  3. Esse eu não tinha ouvido falar (que dirá visto)! Mas, pelos "pais" e referências que ele declarou, não vai ter erro!!! Já vou correr atrás! :?D

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