terça-feira, 15 de dezembro de 2015

Tailgate e seus dois amores

Yep...
Cyclonus, Tailgate e Getaway: um
triangulo amoroso a moda cybertroniana.
Nós jogamos contra a vida, e perdemos.


Quem me acompanha há algum tempo já deve ter notado que eu adoro Transformers. Embora a ficção da franquia seja de forma geral fraca e muito boba, os quadrinhos da IDW tem desde 2009 demonstrado que dá sim pra fazer boa literatura a partir de uma linha de brinquedos. E é desse improvável material que James Roberts usa para tecer, entre tantas subtração,  uma longa narrativa sobre relacionamentos abusivos e manipulação emocional.


Falo é claro do triângulo amoroso Tailgate/Cyclonus/Getaway, em More Than Meets the eye. Relações amorosas já haviam sido abordadas antes no mesmo título (como o casal Chromedome e Rewind, os relacionamentos no passado de ambos, as motivações trágicas de Brainstorm, e uma insinuação não tão sutil entre Orion Pax e o senador Shockwave), mas a Trindade se destaca por vários motivos.


Com essa linha de trama em particular, James Roberts abordou um aspecto crucial de relacionamentos que não era de se esperar em um quadrinho sobre robôs-que-viram-coisas. As maneiras que relacionamentos impactam na vida de alguém já tinham sido discutidas na vida de Domey e Rewind - em particular, o quanto a perda afetava alguém, como relacionamentos tem seus altos e baixos, e como o amor pode evitar que um ciclo auto destrutivo. Desta vez, no entanto, o foco era como relacionamentos podem ser tóxicos. E como o amor pode ser uma ferramenta cruel para manipulação.


Um inocente entre dois canalhas


DEDO NA CABEÇA
Tailgate, sendo... Tailgate
Vamos começar pelas partes envolvidas. Introduzido na mini-série Revelation,  Cyclonus é uma relíquia de uma era distante, um veterano da “era dourada” de Cybertron. Pintando a si mesmo como um guerreiro-filósofo, Cyclonus sonhava com uma nova ordem cybertroniana em um universo caótico - esperando que um mundo ordenado desse estabilidade a sua própria mente perturbada e violenta. Um dos sobreviventes do “universo morto”, Cyclonus é odiado por todos a bordo da Lost Light, por todas as vidas que tirou quando servia sob Galvatron. A única exceção é seu completo oposto e amor improvável: o pequeno e inofensivo Tailgate, introduzido em More Than Meets the Eye #1. Aos seis milhões de anos, Tailgate é uma relíquia do passado, mas ao contrário do cínico e anti-social Cyclonus, ele é puramente inocente, tendo vivido meras duas semanas antes de perder a consciência por eras a fim, fingindo uma história grandiosa e heróica para esconder o fato que ele não viveu. Já Getaway da Incursão de Corcapsia nos foi introduzido no arco “Remain in the Light” (MtMtE #17-22). Um agente do “Bureau diplomático” (um belo eufemismo para “serviço secreto”), o artista de fugas Getaway é tudo que Cyclonus não é: carismático, carinhoso, emotivo e dedicado a fazer o relacionamento “dar certo”.


OUCH!
Qualquer semelhança com Hank Pym é coincidência. 
Ao longo da “primeira temporada” de MtmtE, Cyclonus e Tailgate desenvolveram uma amizade improvável, sustentada em dividirem um quarto (já que ninguém mais queria dormir no mesmo quarto que Cyclonus) e na ignorância do pequenino sobre, bem, tudo. Essa relação começou violenta (MtmtE #4 Life After the Big Bang) e unilateral antes de das barreiras do guerreiro cederem aos poucos. Sentimentos fortes se desenvolveram nesse período, com demonstrações de afeto sutis, marcadas pelas neuroses particulares de Cyclonus. Esse afeto não impediu o veterano de ser rude e insensível com Tailgate. São cenas conflitantes e tocantes - e em mais de um caso, o comportamento insensível é claramente bem intencionado, em forma deturpada. Quando Tailgate foi informado por Ratchet de que ele estava morrendo (de velhice), Cyclonus se desfigurou como uma forma estranha de partilhar daquele sofrimento. Mais tarde, ele ofereceu um conselho cruel: não mantenha esperança de uma cura - porque sem uma esperança, não há nada a ser perdido..

:(
Tailgate em seu leito de morte (posteriormente evitada).
Ao fim de Remain in The Light, Cyclonus salvou a vida de seu pequeno companheiro, mas perdeu sua centelha para o carismático Getaway - que não tratava o ingênuo com insultos, cinismo e violência. Getaway parecia um par perfeito: carinhoso, atencioso, disposto a ensinar coisas novas... Em MtmtE #30 (World: Shut Your Mouth: a Beginner’s Guide to Predestination), ele demonstrou aos leitores como isso não era tão real, usando da sede de atenção de Tailgate para se aproximar dele, simpatizando com sua mentira sobre heroísmo e contando sua não-tão-ilustre carreira militar. Quanto mais o tempo passava, mais Getaway e Tailgate passavam juntos (uma coisa recorrente no fundo de MtmtE em sua “segunda temporada”). E na edição #40 (Our Steps will Always Rhyme), o “par perfeito” novamente demonstrou lado manipulador, tentando afastar de vez Tailgate e Cyclonus dizendo que o ultimo lhe confidenciou que achava Tailgate um “covarde simplório” por seu medo de morrer, brincando com os sentimentos do pequenino. De um “amigo” rude e violento, Tailgate agora era vítima de um predador emocional.
Uma "conversa inocente"
Isolando o alvo emocionalmente...


De um lado, um amor cruel. Do outro, uma crueldade gentil


Sedução, manipulação, ou as duas coisas?
É uma cilada Tailgate!
O comportamento emocionalmente abusivo continuou no #47 (The Lopsided Triangle). Roberts expande o conceito de Conjunx Endura (o casamento cybertroniano) com a introdução do “Conjunx Ritus”, os rituais em preparação para a união. Getaway os explica para Tailgate, informando o que dos quatro atos necessários,  eles já compraram três, faltando apenas um: uma prova de devoção. E como essa prova, Getaway quer que Tailgate faça mneumocirurgia em Megatron. Um ato que certamente resultaria na morte brutal e dolorosa de Tailgate.


Até este ponto,  Getaway manipulou emocionalmente Tailgate rumo a uma união amorosa - da qual logo se descobre que ele não tem nenhum interesse: Tailgate é apenas um fantoche para o insensível e vingativo Getaway, planejando usar o seu “amado” como um sacrifício para acabar com qualquer possibilidade de redenção para o ex-líder dos Decepticons. Para esse fim, ele se aproveitou da carência afetiva de Tailgate e de suas inseguranças com Cyclonus.


Chorando a dor de cotoveloAo mesmo tempo, depois de afogar suas mágoas na bebida, Cyclonus chega a suas próprias conclusões quanto a Tailgate. Depois de ver o quão próximos Getaway e Tailgate estão, ele vai “chorar as mágoas” com a última pessoa que esperava o ver: Whirl, o psicótico, maníaco e rancoroso autobot que outra hora será alvo de um perfil completo. Nessa conversa, Cyclonus reconhece duas coisas: que ele tem sentimentos por Tailgate, mas não há nada que faça ele merecer ser retribuído - e Whirl deixa claro que o melhor que ele tem a fazer é deixar ele ser feliz (ignorando as intenções de Getaway):


"Em breve: Cyclonus de Trixylix em "Meu amigo tem um novo amigo!" HA! Seu safado! Eu achei que isso era vida-ou-morte, não carinha-triste boo-hoo problemas no relacionamento. Aqui vai. Toma uma verdade dura, de graça. Por pura coincidência, você e o Botão de Pânico terminaram sendo colegas de quarto. O que faz você pensar que há qualquer conexão além disso? A única  coisa que vocês tem em comum é uma porta da frente....
"Eu salvei a vida dele."
"E? E o que? Ele te deve? Você deve a ele? Ele não tem permissão pra fazer outros amigos?”
"Eu... sinto por ele."
"Novamente: e daí? Eis uma ideia: quem sabe ele simplesmente goste do Getaway mais que ele gosta de você. Alguém acharia isso supreendente? O que você pode oferecer a ele além de sua desaprovação garantida e  um rosto como um funeral? Tudo que você faz é olhar para a janela! Meu conselho para você? Supere isso - por que ele claramente te superou. E vamos encarar.. ele está melhor com o outro cara.”
Tem um aspecto de personalidade muito forte nesta conversa: Cyclonus pede conselhos a Whirl justamente por que saber que Whirl é, bem, um babaca - mas um babaca que diria aquilo que Cyclonus não quer ouvir: a verdade. Os eventos que vem depois dessa conversa ficarão para outro artigo: a edição saiu no mês passado, e a conclusão desse triangulo amoroso (onde uma das partes não tem sentimento algum pelo amor disputado) tem muito a dar ainda - só posso dizer o quase óbvio: Cyclonus é retribuído, sim, apesar de ter empurrado Tailgate para longe com sua incapacidade afetiva. Mas não há um final feliz, por ora.


Da ficção para a realidade


Os dois relacionamentos de Tailgate tem marcas claras de abuso. Cyclonus, emocionalmente distante, desaprovador e verbalmente violento (quando não fisicamente). Getaway, por sua vez, demonstrando todos os traços de um predador sexual, embora seus interesses com o “jovem” não sejam sexuais. Ele sabe as palavras certas para manipular seu parceiro, torce-lo a sua vontade, e fazer parecer que ele queria isso o tempo todo.


Amor doentio
A forma perturbada de Cyclonus demonstrar preocupação:
Auto mutilação. 
Pessoas assim existem. Cyclonus faz o tipo mais comum de abusador, o tirano emocional, que não tem nada de positivo para dizer a pessoa que ama, e apenas a joga para baixo mais e mais. Assim como muitos abusadores desse tipo, ele realmente ama a sua vitima - mas seus problemas pessoais fazem desse amor uma coisa doentia e tóxica. Mas diferente da maioria dessas pessoas, ele reconhece que é um problema, que ele não faz bem para Tailgate, e que suas maneiras de expressar afeto são pouco diferentes da maneira que demonstra desgosto.


Getaway, por sua vez, é um sociopata - ele não vê problema em manipular e usar Tailgate (ou qualquer outro: Tailgate era só o ‘trouxa mais fácil’) para seus próprios fins, e descarta-los mais tarde. É o tipo de cara que seduz com promessas de amor perfeito e devoção, apenas para descartar mais tarde, depois de levar pra cama. Não é improvável pensar que no caso (implausível) de Tailgate sobreviver a seu “ato de devoção’, Getaway seria um “marido” mais abusivo e insensível que Cyclonus era como “só amigo”.


Manipulação emocional 101
Getaway, dizendo exatamente o que Tailgate quer ouvir
Cyclonus está longe de ser o tipo que agride fisicamente o companheiro (embora  tenha tido incidentes disso antes de desenvolver sentimentos por Tailgate), mas ainda assim é um relacionamento tóxico, do tipo que deixa a pessoa se sentindo “um nada”. Getaway, por outro lado, há pouco que leve a pensar que ele não seria fisicamente abusivo depois que seu uso para Tailgate acabasse.

Cyclonus, apesar de tudo de ruim que já fez, pode se redimir - a primeira parte ele já fez: reconhecer que é um problema. O resto vai depender do futuro e de se ele vai querer mudar e se esforçar nisso. Getaway e pessoas como ele não tem salvação: relacionamentos para eles são meios para um fim, sem ter qualquer valor na ligação afetiva em si. Nada disso faz de Cyclonus alguém inocente, no entanto. 

Assim como outro abusador famoso de quadrinhos não pode ser inocentado do que fez só porque se arrependeu e se esforçou para mudar - mas o abuso mútuo entre Hank Pym e Janet van Dyne é assunto para outra hora.  

todas as imagens por Nick Roche.

domingo, 13 de dezembro de 2015

Baú de Brinquedos: Monster High, levando o "macabro" para a sessão de meninas.

Um tema que não se espera em uma linha para meninas
Monster High: figuras "macabras" para meninas.
Um dos tipos mais abundantes de brinquedos no mundo são Fashion Dolls, bonecas cuja principal característica são roupas de verdade*. A mais famosa dessas bonecas é, obviamente, a Barbie, produzida pela Mattel. O estilo visual dessas linhas varia bastante, mas no geral elas são todas a mesma coisa: corpos irreais, moda, acessórios e fofoca.


Mas a mesma fabricante da Barbie trouxe uma surpresa agradável para o mercado em julho de 2010, com a linha Monster High. Criada por Garret Sander e usando arte de Kellee Riley  e Glen Hanson, Monster High se destacou pelos temas “assustadores” e “nojentos” como monstros  mortos-vivos - geralmente relegados a linhas “para meninos”, e em sua maioria, linhas de blind bags e outras miniaturas não articuladas sazonais - Monster High cobriu as prateleiras rosadas das alas para meninas com lobisomens, zumbis, fantasmas e carniçais.


A primeira coleção era simples: cada boneca incluía como acessório um “diário secreto” (padrão repetido em outras coleções da linha) e um stand temático. O padrão visual lembra a linha concorrente “Bratz”, com proporções exageradamente magras e pernas extremamente longas - daí a necessidade do stand, pois elas mal são capazes de ficar em pé. Ao mesmo tempo que o design apela para o “monstruoso”, também apela para o mesmo padrão de beleza desse tipo de linha. Em suma, “garotas monstro lindas”.


A "fashion Doll" original
Bild Lilli: de onde todas essas bonecas se originaram
Enquanto a média das “fashion dolls” são tijolos com o mesmo grau de articulação da ancestral da Barbie, Bild Lilli (que não era voltada para crianças), a linha Monster High é marcada por um grau enorme de articulação: juntas universais nos ombros, cotovelos, pulsos, quadris, joelhos e pescoço, totalizando 11 pontos de articulação e mais de 20 eixos de movimento, comparável a linha original de G.I. Joe. Ao contrário da maioria das linhas do gênero,  os moldes não são reciclados, com apenas mudanças de roupa: praticamente todos os personagens (mais de 50!) contam com um molde “único” (até que seja usado em outra boneca dela mesma ou muito similar) com variações de textura, detalhes (como pelos e chifres) ou altura - com uma média de 27cm.


Em seus 5 anos de produção, Monster High teve todo tipo de monstros e assombrações: dos mais básicos vampiros e lobisomens até mulheres mariposa, monstros marinhos e plantas carnívoras.  Até alguns seres demoníacos deram as caras (na linha Create-A-Monster) e a animação contou com uma breve aparição das proles estelares do grande Cthulhu! Mas como toda boa linha, ela tem suas estrelas...


As personagens e o cenário



A imensa criatividade dos designs de Monster High infelizmente não dá as caras no cenário da linha, uma escola para monstros em Nova Salem,  (eu tenho certeza que teve um filme do Salsicha e do Scooby sobre isso...), meramente dando um toque “macabro” para os típicos dramas colegiais. Ao mesmo tempo, a série tem todo um mundo mal explorado de monstros e espectros, abordado em recortes nos diários e animações.


Faltando duas figuras.
Parte da coleção original.
A protagonista de Monster High é a jovem Frankie Stein, a “filha” do Monstro de Frankenstein e sua “noiva”. Com meros 15 dias quando a ficção de Monster High começa, Frankie é ingênua, desastrada, lenta e dada a “choques”. Complementando a primeira coleção de Monster High estão suas amigas Clawdeen Wolf (filha dos lobisomens), extrovertida e atlética; Draculaura (filha -adotiva - do Conde Dracula), a mais “menina” do sexteto original, e um dos muitos casos de “vampiros vegetarianos” em ficção infantil; Lagoona Blue (filha da criatura da lagoa negra e uma ninfa marinha), uma estudante de intercâmbio australiana mais “tomboy” - e que foi saindo de foco com os anos. Além do quarteto original, a primeira coleção contava também com a “Fearleader” Cleo de Nile, (filha da múmia), a típica “alpha-bitch” de séries de High School, vendida em conjunto com seu namorado, o “jock” Deuce Gorgon (filho da Medusa); sua confidente/capacho/melhor amiga, a nerd Ghoulia Yelps (filha de zumbis - não me pergunte como isso funciona), que só se comunica por grunhidos e o esquentado DJ Holt Hyde (filho do Dr. Jekyll).


Um tipo de figura que se espera em uma linha de fantasia medieval
Gêmeas siamesas?
Com o passar dos anos a linha explodiu em número de personagens, introduzindo referências que vão de faces familiares como o Abominável Homem das Neves (Abbey Bominable), o Cavaleiro sem cabeças (A diretora sem cabeça Bloodgood), fantasmas (Spectra Vondergeist, entre outras) e o Fantasma da Ópera (Operetta - ignorando que o Fantasma da Opera era só um cara desfigurado) até obscuridades e excentricidades como o yokai Noppera-bô (Kiyomi Haunterly), mulheres aranha (Wydowna Spyder), o “pé grande” sul-americano Maricoxi (Marisol Coxi), robôs (Robecca Steam e Elle Eedee) e a hidra de lerna (Peri e Pearl Serpentine - uma boneca de duas cabeças). Cleo foi substituída como “antagonista” pela mulher tigre Toralei Stripe em 2011. Onde a primeira era a “garota popular”, Toralei é a “rebelde sem causa”, quase um Arthur Fonzarelli (do seriado Happy Days) do mal.


Também foram introduzidos mais rapazes, como o elemental do fogo Heath Burns, o zumbi Sloman “Slo-Mo” Mortavich, o Homem-Peixe Gillington “Gil” Webber (namorado de Lagoona), o lobisomem Clawd Wolf (irmão de Clawdeen e namorado de Draculaura) e o bizarro “zumbicórnio” Neightan Rot - metade zumbi, metade unicórnio - e um personagem cadeirante, lançado no fim deste ano, Finnegan Wake (cujo nome é uma referência ao romance experimental de James Joyce)

Representatividade deficiente - só falta alguém fora do padrão Magro e/ou atlético
Cadeirantes: o tipo mais raro de boneco. 


Vários desses personagens foram introduzidos em animação antes de aparecerem como brinquedos, e linhas posteriores introduziram personagens que não eram alunos da escola do título. Além disso, muitos personagens de Monster High (por ora) existem apenas na ficção, sem um brinquedo acompanhante.


As animações



Melhor que a média para Flash
Comerciais nada disfarçados.
Como muitas linhas de brinquedos, Monster High contou com animação como um meio de promoção. Mas enquanto outras coleções contavam com séries animadas na televisão, Monster High optou por um caminho mais barato: curtas produzidos para a internet, e especiais mais longos lançados diretamente em vídeo. Até 2012, as animações (que em sua grande maioria condiziam com o lançamento de coleções temáticas) eram produzidas em Flash, com narrativas simples voltadas para promover as bonecas mais novas.

Em 2012, a produção passou a focar quase que exclusivamente nos especiais, produzidos em CGI-não-muito boa. A parte boa: elas parecem com as bonecas. A parte ruim: elas parecem com as bonecas. Essas animações são o tipico água-com-açucar de desenhos para meninas, misturado com o besteirol americano de séries colegiais, e um toque de sobrenatural - nada para se escrever a respeito. Houve também uma série de curtas animados no Japão, sem muito que a destaque da animação americana (e também se resumindo a um comercial disfarçado.


Não acho que era esse tipo de "creepy" que queriam...
Uncanny Valley atingido 100%
O que deve ser dito a respeito delas são duas coisas: a primeira é que com o passar dos anos Draculaura foi “roubando o foco”, incluindo especiais dedicados a ela (coisa que nenhuma outra teve). A segunda é que, embora conte com nomes notáveis da dublagem americana como Laura Bailey, Yuri Lowenthal e Wendee Lee, Monster High tem uma das piores dublagens em séries do tipo, dando a impressão de que todo mundo teve a voz digitalmente alterada para ficar mais aguda.


As sublinhas



Monster High não se ateve somente ao básico, e como quase toda linha moderna de brinquedos convertida em franquia multimídia, se espalhou em muitas linhas secundárias - algumas voltadas para o aspecto Fashion doll, outras sem qualquer relação com o play-pattern da linha original.


Pense "boneco Jumbo" , só que articulado.
Enorme e gosmenta.
As grandes linhas “de bonecas” de Monster High centraram se em temas, sendo essencialmente imprints temáticos da linha, indo de temas como “praia” e “festa” a “zumbi” e “arábias”. Algumas dessas linhas temáticas tiveram mais destaque, como Boo York, Boo York (broadway), Freaky Fusion (personagens fundidas ou monstros híbridos), Haunted (fantasmas) e Freak du Chic (circo - que contou com a maior boneca da linha, Goolliope Jellington, com 47cm de altura - maior que o Devastator que eu resenhei).


Outra linha de destaque foi Ghouls Alive!, uma linha breve com apenas seis bonecos (Frankie, Howleen, Robecca, Spectra, Toralei e Deuce) com efeitos de luz e som. Enquanto outras linhas tinham bonecas cantantes, está tinha bonecas que levavam choques, uivavam e emitiam sons fantasmagóricos.
Um dos exemplos da linha.
Figuras desmembradas para meninas? Sim!


Creepy nem descreve
De normal a macabro só trocando peças.
Uma das maiores sublinhas, durando três anos, foi Create a Monster. No lugar das figuras prontas e pré-estabelecidas, a linha oferecia as partes do corpo para criar “seus próprios monstros” e misturar a vontade. Em 2014 ela foi seguida por “inner Monsters” (Jonathan Wojczik, do Bogleech.com avaliou uma das figuras aqui), uma micro coleção de três bonecas com cérebros expostos, que contavam com multiplas opções de escalpos, rostos, olhos e orgãos internos. E que como suas antecessoras, podiam ser desmembradas com facilidade. As três figuras da linha eram uma fênix/demônia, uma garota planta/polvo e uma garota pavão/demônia.


Cérebros expostos em brinquedos pra meninas? Tem sim!
adoravelmente gory
Mas as linhas secundárias que saiam do padrão também se destacam. Além dos basicos conjuntos de maquiagem, roupas (reais ou para as bonecas) e playsets, Monster High conta com linhas de minifiguras em vinil, bichinhos de pelúcia, bonecas de pano (incluindo um que tecnicamente é parte da linha principal, Hoodude Voodoo), designer toys (monster Cross) gravadores (Secret Creepers, bichinhos de estimação das personagens que gravam e reproduzem sons quando seus cérebros são pressionados) e em 2015, centauras, a linha Frightmares, criada para competir com My Little Pony depois que a Hasbro fez uma linha para competir com Monster High. Essas são só algumas das linhas de Monster High: não há como cobrir todas aqui (mas há uma wiki se quiser saber mais).

Centauras infernais para competir com My Little Pony


Assim como na linha principal, as linhas secundárias de Monster High se destacam na ousadia rara para uma linha para meninas. O tom macabro-mas-fofo da linha resultou em coisas como bichinhos cujos esqueletos brilham, figuras com cérebros expostos e bonecas mutiláveis. Apenas um dos spin-offs de Monster High saiu desse padrão...


O spin-off : Ever After High



De monstras a contos de fada... de volta ao tradicional
Uma linha mais "tradicional".
Lançada em 2013 como uma linha derivada, mas separada de Monster High, Ever After High é tudo o que Monster High não é: onde a original focava em monstros, filmes de terror e similares, Ever After High é sobre os descendentes de personagens de contos de fadas (premissa que a Disney e a Hasbro reaproveitaram em Descendants). Mais tradicional, a linha não tem tanto sucesso (embora ainda seja um sucesso estrondoso) como Monster High, talvez por não ter nada que realmente a destaque.


Ainda assim, Ever After High tem seus pontos de criatividade em um mercado primariamente composto por imitações de imitações. A ficção da série estendeu as intrigas de colégio para uma sutil “guerra política” entre os Reais que desejam seguir o script dos contos de fada e repetir a trajetória de seus pais e os Rebeldes, que querem escrever seu próprio destino.


Skywarp fêmea?
Raven Queen: a protagonista improvável.
Nisso, Ever After High escala a filha da Rainha Má (Raven Queen) como a protagonista (que não se conforma com o papel que lhe foi designado no nascimento) e a filha da Branca de Neve (Apple White) como uma vilã inocente, que não entende porque alguém rejeitaria o seu destino, sem entender que enquanto ela tem um final feliz reservado, há quem só tenha sofrimento pré traçado. Assim como em Monster High, há uma miríade de personagens conhecidos e não tão conhecidos referenciados entre as bonecas de Ever After High  - incluindo um raro take do arquétipo do “vilão traíra” (vulgo Starscream), Duchess Swan, filha da Rainha Cisne e que aceita o seu destino - contando que ela possa roubar o final feliz de outra pessoa. Ever After High também tem uma wiki, aqui.


Monster High é uma linha rara: algo que inovou o estagnado mercado de brinquedos para meninas, e demonstrou que ele não precisa se restringir apenas a “moda” e “tarefas domésticas”. Ao invés disso, arriscou no monstruoso e conquistou uma fatia de mercado considerável, dando uma lição valiosa de como meninas querem mais do que só “o rosa”. É uma pequena ilha de diversidade nas estantes de brinquedos, com uma criatividade efervescente que parece longe de se esgotar. E longe de ficar sem monstros para homenagear.

Centaura-Harpia, Mariposa-esqueleto, Sereia-fantasma... A rota Fuzors sempre funciona
E se as ideias acabarem, sempre dá pra seguir a rota de Beast Wars Fuzors: MISTURA TUDO. 



* G.I Joe e outras linhas de “action figures” naseceram como “fashion dolls” para rapazes. No lugar de roupinhas estilosas, estavam uniformes militares e armas.