segunda-feira, 5 de março de 2012

A visão da Marvel e da DC sobre a imprensa

Bem, como todo mundo deve saber, a Marvel e a DC tem visões de mundo completamente diferentes em bem... tudo. Porém acho que nada diz mais a respeito das visões político-editoriais das duas do que a maneira como retratam o mainstream do jornalismo: enquanto a DC - em seu usual discurso conservador e ufanista - retrata o seu maior jornal, o Planeta Diário, como sendo um paragono exemplar de ética e veracidade, a Marvel é um tanto diferente. O Clarim Diário é uma leitura muito mais crítica do papel da imprensa, e o quão frágil e corruptível é esse papel. Mas bem, vamos por partes, sim?


O Planeta:


Embora tenha o pior julgamento de notícias do mundo (qual foi a última vez que a manchete não era algo sobre o Superman?), o Planeta Diário é "o jornal que nunca mente"; seu editor, Perry White, é um homem de ética inexorável, seus "repórteres estrelas" Lois Lane e Clark Kent nunca estão envolvidos em falcatruas, e nunca são forçados a omitir informação, privilegiar o ponto de vista de, digamos, Lex Luthor, ou ignorar uma violação grave da lei "por pressões políticas".

Não apenas a ética jornalística de White é constantemente reafirmada, mas ele é um dos melhores casos de "bons chefes" na indústria de quadrinhos: excluindo se algumas bizarrices na Era de Prata, sua relação com os funcionários é a da mais perfeita cordialidade, jamais agredindo ou abusando verbalmente da sua equipe.


Até em termos estéticos a DC romantiza o jornalismo: todos os repórteres da editora são belos, sem nenhum sinal de cansaço; a redação do Planeta Diário é uma perfeição organizacional, e o jornal fica em seu próprio arranha céus. Coisa que não ocorre nem com um gigante da imprensa como o New York Times. E não é brincadeira: supostamente Lois Lane está sempre fazendo hora extra, e sempre com uma grande reportagem a caminho. Porém, em todas as suas aparições, ela parece saída diretamente de um ensaio fotográfico - mesmo quando está em casa. E é claro, por mais "apatetado" que Clark Kent possa parecer, ainda é  o Superman, sem nada que possa se chamar de "disfarce" - e a falta de carisma de Kent foi "apagada" a muito tempo.

O Clarim:


Enquanto isso, no universo Marvel... O editor-chefe do Clarim Diário, J. Jonah Jameson, é praticamente o "Perry White Bizarro": enquanto White é um homem cordial, otimista, e ético, Jameson é cínico e mau humorado. Seu compromisso com a verdade só vai até onde esta se encaixa com seus interesses - como demonstrado pela perseguição constante do Clarim contra o Homem-Aranha, com manchetes sensacionalistas como "Homem-Aranha: Perigo ou Ameaça?". Jameson é quase um Bill O'Reilly dos quadrinhos: conservador, beirando o racismo, vendo uma "conspiração liberal" em praticamente tudo. Os funcionários de Jameson são tratados como lixo: não são raros os comentários de "ter sido demitido pela terceira vez esta semana", assim como as agressões verbais - e as vezes físicas - do bigodudo.

E mesmo quando o cinismo de Jameson não fica no caminho da verdade, o Clarim encontra outro problema: é grande demais para lidar realmente com os problemas. A cada vez que tentam dar a verdade, o emaranhado de "fita amarela" causado pelo simples tamanho do Clarim lhes força a ficar "de fora". Sim, em termos nacionais e globais o Clarim pode fazer muito: mas quando se trata dos pequenos problemas... Simplesmente é chamativo demais. Isso quando não cede a pressão política e econômica - motivo pelo qual Norman Osborne consegue manter uma boa imagem pública.

E o principal repórter da editora é também o "anti-Clark Kent": Ben Urich, ex-repórter do Clarim Diário. Enquanto Kent nunca se rende, Urich à muito se rendeu ao sistema: foi apenas durante a Guerra Civil que o veterano decepcionado decidiu sair do Clarim e fazer jornalismo de verdade. Nas duas minisséries Frontline, junto com a repórter independente Sally Flloyd forma o jornal Frontline. contando aquelas histórias que o Clarim não pode - ou não quer contar - Urich retoma seu auto-respeito. Porém o contrário ocorre com Sally Flloyd: de uma repórter ética e comprometida com a verdade, lentamente se torna tão cínica e interesseira quanto Jameson, se não pior: o takedown exagerado de Flloyd contra o Capitão América pela recusa dele em se tornar tão cínico, fútil e banal quanto a média da sociedade americana, como se direitos civis e liberdade deixassem de importar porque a população está ocupada demais com Nascar, Facebook e o O'Reilly Factor.

E assim como na DC, a estética diz muito da visão da editora: tanto Urich quanto Flloyd parecem... acabados. As olheiras são uma das marcas mais chamativas do design visual dos dois, especialmente ao longo das duas Frontline. Urich raramente está bem arrumado, a redação tanto do Frontline quanto do Clarim é uma bagunça, e nem Flloyd, nem Jameson, nem Urich são exemplos de comportamento. Além da Irrascibilidade de Jameson, há o alcoolismo (e anterior uso de drogas pesadas) de Sally Flloyd, e as não poucas violações legais de Urich - para não mencionar seu envolvimento com crime organizado, e assim como Flloyd, uso de drogas. Enquanto a DC romantiza o jornalismo, a Marvel retrata o pior dele. Nem uma visão nem outra são retratos da realidade - mas a segunda é uma visão muito mais honesta, já que não finge a perfeição.

4 comentários:

  1. Mas tem-de se ter em mente que, já de partida, as duas editoras colocam seus principais jornais em pontos divergentes: enquanto o Planeta Diário é base dos mocinhos (Lois, Clark, Jimmy), o Clarim Diário é sede do oponente mais perene do Aranha, ninguém menos que J. J. Jameson (que inclusive é o responsável direto pela criação de um vilão do Aracnídeo, o Escorpião).
    Ou seja: na Distinta Concorrente, o jornal está para os mocinhos - na Marvel, aos vilões.

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    1. Acho que a questão maior é que na Marvel o sistema privilegia os vilões: Jameson representa o Clarim como EMPRESA, enquanto o jornalismo de fato é feito pelos "peixes pequenos" - e salvo a birra com o Aranha, o Jameson não é ativamente perverso: só egoísta, autoritário e insensível, mas em vários pontos é claro que ele tem boas intenções, por mais que as suas visões políticas fiquem no caminho.

      A visão da DC é muito mais simplista: com poucas exceções, ou se é um vilão mau mau mau, ou se é um herói exemplar, e mesmo as falhas de caráter dos heróis são para reforçar o heroísmo. E o jornalismo da DC é sempre neste aspecto - quando há um jornalista corrupto, nunca é fruto de uma série de fatores complexos, não: ele simplesmente é podre por dentro (e em geral, por fora também) porque "blá". O mesmo vale para todo as outras entidades sociais (exceto em Gotham, onde tudo menos o comissário Gordon e a "família Batman" é podre)

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  2. Eu queria ter um patrão como o perra, quantas vezes o clark ficou semanas ou meses desaparecido e mesmo assim o RH sempre recebe ele de braços abertos. E concordo com o que o Lucas falou, e digo mais, um grande problema é que o JJ não tem um personalidade fixa, até o próprio stan lee ficava mudando o comportamento dele desacordo com o que era melhor pra historia.
    E discordo quando você diz que a DC tenha um discurso "conservador e ufanista", muito pelo contrario, o conservadorismo é uma marca registrada da marvel, a administração Bush é a prova disso, enquanto a DC aproveitava sempre que podia pra cutucar os absurdos da ocasião (com a cereja do bolo sendo o Lex Lutor fazendo um campanha política idêntica ao Bush Jr) a marvel tentava de todo o jeito fazer um propaganda pró governo, o que culminou com a vergonha guerra secreta, ou até mesmo o Mark Millar sendo obrigado a mudar o final de Guerra civil para algo mais "certo".

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    1. A guerra secreta do Nick Fury foi retratada comouma das mais estupidas, ml pensadas e autoritarias iniciativas da SHIELD; O final de Civil War e tipico do Mark Millar, tentar isentar o cara que constantemente afirma que liberais sao retardados e jogar a culpa na editora, quando TODOS os outros escritores da Marvel retratavam o lado pro registro como na melhor das hipoteses covarde,e na pior como fascistas e fazer uma leitura muito estranha do evento inteiro. E de novo... tentar limpar a cara do Millar? Mark "Os Supremos" Millar? Que ficou brabinho porque a morte do Cap' foi uma morte digna, e nao uma execucao de um traidor? Esse Mark Millar? A Dc criticou algumas politicas da era Bush, e com o problema sendo o individuo Luthor, nao a falta de perspectiva americana - a Marvel teve "so" O Capitao America durante a maior parte dos anos Bush essencialmente repetindo "mas que merda voces estao fazendo"? E a cada decisao digna do GOP, o universo Marvel ficou MAIS distopico, enquanto a DC esta defendendo uma politica linha dura, borderline "bandido bom e bandido morto"

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